Nada pode ser mais
intempestivo, ignorante e descolado da realidade que o raso
raciocínio elaborado pelos defensores da redução da maioridade
penal no Brasil para 16 anos.
O grau de virulência
desses pensamentos é diretamente proporcional ao aumento astronômico
dos números da violência que eles dizem que pretendem diminuir a
partir da adoção dessa medida. Propor, votar e apoiar tal ação
nada mais é que uma reação desproporcional e sem qualquer
precedente de "sucesso" ante nosso sanguinolento cotidiano.
Poucas vezes na
história a velha e ultrapassada Lei de Talião, adotada há cerca de
40 séculos na Mesopotâmia, foi tão utilizada para sobrepujar a
Constituição de um país e fazer valer uma lógica na qual a ideia
do "olho por olho e do dente por dente" passe por cima da
dignidade humana e, consequentemente, nos deixe cegos e banguelas.
É exatamente este o
modelo de retrocesso que a maioria dos nossos congressistas e seus
lacaios apoiam para obter uma solução mágica que ponha fim à
incessante endemia de assassinatos, assaltos, sequestros, estupros e
outros crimes que atingem o Brasil. Julgar, condenar e encarcerar
adolescentes a partir dos 16 anos como se estes fossem adultos.
A realidade dos
presídios brasileiros que aguardam pela chegada dos jovens que
cometeram delitos não mente, ao contrário de quem acredita que eles
vão "pensar duas vezes antes de cometer um crime" caso a
lei seja aprovada. Será mesmo!?
O índice de
reincidência na criminalidade dentro do universo de presos que
cumprem sua pena no Brasil chega a 70%. Traduzindo, de cada 10
pessoas que ganham a liberdade, 7 voltam a cometer crimes, sejam eles
mais graves, menos graves ou semelhantes aos que cometeram para que
ficassem atrás das grades.
O crime compensa,
pois na maioria das vezes, é a opção que resta ou então é a que
melhor remunera. Na facção que domina os presídios de São Paulo,
auto-intitulado o Estado mais rico, e também o Estado que mais
prende e o Estado onde a Polícia Militar mais mata, uma boa
colocação no bilionário mercado do tráfico de drogas após a
concessão da liberdade paga quase 10(dez) vezes mais que um salário
mínimo paulista. Definitivamente, o crime compensa. Ao menos
financeiramente, não resta dúvida que sim.
Mas ainda existe
"salvação". Dos 30% restantes não reincidentes, há os
que se tornam religiosos, há os que conseguem um emprego de pouca
monta, e há claro, os que voltam a cometer crimes, mas não voltam a
ser presos. A cadeia não foi feita para recuperar ninguém, mas para
doutrinar alunos e admitir novos "recrutas". Parafraseando
texto publicado pelo escritor Frei Betto na última quinta-feira,
02/04, no site Pragmatismo Político:
Não existe, no
Brasil, política penitenciária, nem intenção do Estado de
recuperar os detentos. Uma reforma prisional seria tão necessária e
urgente quanto a reforma política. As delegacias funcionam como
escola de ensino fundamental para o crime; os cadeiões, como ensino
médio; as penitenciárias, como universidades.
Ora, mas não é
este o grande argumento dos arautos da moralidade que pretendem punir
os adolescentes a partir de 16 anos com os mesmos critérios daqueles
que já possuem 18? Se o temor de ser detido existe por parte de quem
está prestes a cometer um crime, por que a reincidência é tão
alta entre os adultos e por que os jovens seriam inibidos ao ponto de
se "comportarem"? Penas mais pesadas? Se 70% dos adultos
seguem sendo criminosos, submetidos a tais penas, o que muda para os
adolescentes? Absolutamente nada. Seguirão cometendo delitos da
mesma maneira.
O projeto de lei que
reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos atende a anseios de gente
importante. Não a mim, nem a você, nem a uma maioria de uma
pesquisa perdida, vítima ou não de violência por parte dos
criminosos. Atende a uma horda de políticos, juízes, advogados,
agentes penitenciários, policiais civis, militares e "jornalistas"
que integram uma quadrilha diretamente interessada na não
recuperação dos detentos de qualquer faixa etária.
Faço um especial
para meus "colegas" da imprensa, que se deleitam todos os
fins de tarde ou até mesmo na hora do almoço, a depender da região
do país, cobrando das "autoridades" um posicionamento mais
firme contra a criminalidade ininterrupta que campeia a cada esquina,
incentivando a violência para responder à violência, exigindo os
rigores da lei para punir os delitos, e lucrando altas cifras com a
manutenção da audiência nas alturas, no mesmo patamar em que se
encontram os índices de criminalidade.
O que seria de um abutre sem a fétida carniça, a carcaça podre e inerte!? Morreria de fome.
O que seria de um abutre sem a fétida carniça, a carcaça podre e inerte!? Morreria de fome.
O sistema se
retroalimenta. É um ciclo com funções bem definidas e organizadas.
E se os mais de 500 mil presos adultos que atualmente sobrevivem nas
penitenciárias do Brasil são insuficientes para atender às
demandas da horda, há de se fornecer a ela mais para o seu sustento.
E é aí que entram quem? Os adolescentes infratores, agora tratados
como adultos.
Mas se a violência
não diminuir, não haverá problemas, pois lá estarão os arautos
da moralidade novamente para reduzir a maioridade penal para 15, 14,
13 anos. Mantê-los internados em casas de recuperação por um
período limitado impede o pleno funcionamento do ciclo. Não importa
a idade. O importante é fornecer a ração para a horda, insaciável.
A horda é
basicamente formada pelos carcereiros e diretores corruptos que
garantem aos peixes grandes privilégios mediante propina, pelo
investigador que esclarece apenas 2% dos crimes cometidos, pelos
magistrados que adotam a reclusão como o padrão para qualquer
crime, seja ele grave ou não, pelo PM que tortura em busca de
verdades inexistentes, pelos advogados literalmente de porta de
cadeia, que ficam à espreita para explorar a inocência da família
de um preso de baixo calibre, ou pelos deputados que patrocinam a
violência por meio do tráfico de armas, de drogas, ou através de
seu veículo predileto na imprensa.
A horda precisa de
seu sustento, de seu quinhão, e não vai largar o osso. Ainda mais
um osso assim, tão cheio de carne. O sistema penitenciário é um
grande negócio. Não à toa, sua privatização foi consumada nos
EUA e já é cogitada no Brasil. Para ter mais eficiência? Não.
Para registrar lucros, sem intermediários. E enquanto os dividendos
aumentam, novos Carandirus, Bangus e Pedrinhas seguirão existindo,
com mais mortes, mais barbárie, mais violência. E agora com a
presença de uma nova geração.
Ganha a horda, perdemos todos nós.
Veiculado também no portal Surubim News: http://www.surubimnews.com.br/a-horda-e-o-lucro-com-a-barbarie-da-nova-geracao/
Ganha a horda, perdemos todos nós.
Veiculado também no portal Surubim News: http://www.surubimnews.com.br/a-horda-e-o-lucro-com-a-barbarie-da-nova-geracao/