domingo, 20 de dezembro de 2009

A opinião divergente que amplia o conhecimento

Já dizia o filósofo Voltaire: "Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei até a morte o seu direito em dizê-la". Frase eternizada através da luta ativa pela tolerância, o respeito e a liberdade de expressão, mesmo essas três virtudes não sendo ainda valores universais em nosso mundo mundano e sujo.

Lembrar desse pensamento sempre faz com que nós, seres humanos, tenhamos apropriado ao nosso ser opiniões divergentes, sejam elas atuantes sobre a visão política, o futebol, a arte, ou o sentido da vida, e vindas das mais diversas origens. Do colunista do jornal, do amigo no buteco, da Dona Maria cozinheira ou do seu Zé da padaria.

O exercício diário de ouvir, ler e assistir a essas intervenções causa, de maneira extremamente interessante, a ampliação do nosso conhecimento e, consequentemente, nossa valorização enquanto pessoas. Dentro das discussões desenvolvidas, respeitamos, toleramos e concedemos liberdade. No entanto, sem jamais desistirmos de nossas ideias e ações.

A construção desse raciocínio surge quando se pensa nos enormes benefícios trazidos por meio de cada contribuição dos indivíduos que, de forma rápida e simples ou contínua e complexa, nos mostram meandros das reflexões cotidianas por onde jamais imaginaríamos nos instalar, ou ainda não havíamos arriscado a voar.

Levado a cabo esse pensamento, todo o processo de apropriação se desenvolve de forma espontânea, seguindo os estudos do teórico da psicologia social, Vygotsky, que tratam da ligação entre a história da sociedade e o desenvolvimento do homem.

Para Vygotsky, "a aprendizagem sempre inclui relações entre pessoas. Ele defende a idéia de que não há um desenvolvimento pronto e previsto dentro de nós que vai se atualizando conforme o tempo passa. O desenvolvimento é pensado como um processo, onde estão presentes a maturação do organismo, o contato com a cultura produzida pela humanidade e as relações sociais que permitem a aprendizagem. Ou seja, o desenvolvimento é um processo que se dá de dentro para fora."(Trecho retirado do site http://www.euniverso.com.br)

Toda essa teoria, no entanto, só tem garantido um bom resultado quando vai incluída no seu bojo a livre manifestação dos indvíduos ou grupos. Dessa forma é possível receber as opiniões alheias com tolerância e aplicar o conhecimento adquirido, organizando, instintivamente, a abordagem aos diversos assuntos que fazem parte do dia a dia. Tornamos essa possibilidade real quando, a cada troca de palavras, executamos, mesmo sem intenção, o que aprendemos em um diálogo, leitura ou visão anteriores.

Os dois pensadores citados neste texto não são contemporâneos, nem analisam aspectos do conhecimento humano de maneira semelhante. Suas teorias aplicam-se a diferentes áreas, psicologia e filosofia, e tem alcances inimagináveis que não se resumem às frases postadas aqui. Mas o relacionamento entre cada um desses pontos foi apenas um jeito de tentar explorar a essa experiência no papel(ou na tela do computador), que já venho tendo na prática há bastante tempo.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Morte de uma entrevista anunciada

Acordei bem disposto, tomei banho, aparei a barba, coloquei aquela camisa no corpo e aquele gel no cabelo, todo o estereótipo padrão preparado, chato e infelizmente necessário, visando garantir uma entrevista tranquila para a reportagem da nova revista que começo a fazer.

Indeciso sobre se pegaria o ônibus ou o táxi para chegar até o meu destino, distante pelo menos 9km de onde moro, resolvi pela segunda opção, dado o calor excessivo que me deixaria exposto às ações de minhas excitadas glândulas sudoríparas e a pressa para chegar.

No entanto após dez passos saídos do prédio me lembrei do esquecimento das perguntas já previamente preparadas, estudado o assunto durante mais de duas horas na noite anterior, para não incorrer em cagadas nem enganos.

Volto para o apartamento e na hora de abrir a porta não consigo porque a sua já comprometida fechadura quebra minha chave, e eu tenho de esperar por meu colega de apartamento atender à estrondosa campainha e me ajudar nessa.

Saio em polvorosa e custo a achar o transporte, até que chego em um ponto onde sei sempre está algum de bobeira. Entro feito um maluco e já vou passando as instruções do endereço, sem esquecer de cumprimentar o cara, como de costume.

A conversa flui muito bem, é um profissional gente boa, que se interessa pelo trabalho de seus clientes e suas origens. As risadas e as informações vão tranquilas, mesmo com o trânsito monstruoso ali ao lado, até o maldito celular começar a vibrar e tocar.

Do outro lado da linha, a temida secretária do entrevistado, com voz de sono, me quebra no meio. "Infelizmente surgiu um imprevisto porque o senhor x foi ao dentista e devido a uma anestesia não poderá conversar hoje. Vamos ter de remarcar." Encerra.

Digo logo que tudo bem, abstraio, penso, faço xingamentos silenciosos incontáveis, e desligo logo o telefone para não proferir besteiras. Peço ao camarada taxista que faça o retorno e me deixe em casa, e me despeço com R$20 a menos na mão e um milhão de ideias na cabeça.

Chego em casa, tomo minha gelada e sagrada água, reflito novamente e tenho novamente de abstrair. O trabalho continua em outras frentes - clipagem, livro, assessoria, e o que mais vier, e não é uma falta de atenção em me avisar com antecedência que vai me desestruturar.

Alguns diriam: "Não devia ter saído de casa hoje". Outros gritariam, dariam murros em paredes ou em portas, quebrariam copos ou rasgariam papel, mas eu passei dessa fase grotesca. Estou mais tranquilo do que nunca.

A toada segue e a melodia não pode parar. Mesmo que haja sempre algum descompasso de um instrumentista insistente em errar.

A entrevista foi como Santiago Nasar, do livro Crônica de uma morte anunciada, de Gabriel García Márquez. Já sabia de seu bater de botas antes de acontecer.

Mas não descansarei para ficar remoendo e chorando o falecimento. Antes que a ressuscite, vou me ocupar com aquelas que continuam vivas.